Quem sou eu

Minha foto
Salvador, BA, Brazil
Analista de sistemas, expert em telecom, formado em Eng. Elétrica e nerd assumido

sábado, 27 de agosto de 2011

Redes de telecomunicação (7) - Telefonia celular (parte 1)

Neste artigo (em várias partes) vou tratar do surgimento e evolução das redes de telefonia celular, inicialmente como um serviço de voz, complementar ao serviço de voz oferecido pela rede fixa, e posteriormente assumindo uma dinâmica própria, e assumindo um papel até mais destacado que a telefonia fixa.

A telefonia móvel trouxe um novo problema, que não existia na telefonia fixa. Para garantir mobilidade os usuários teriam que conectar-se à rede usando enlaces de rádio. Então, como organizar o uso (isto significa essencialmente como controlar eventuais interferências) dos recursos de rádio na rede de acesso?

Para solucionar este problema foram experimentadas várias opções, mas a que se mostrou mais prática foi dividir a geografia da área a cobrir com o serviço em pedaços menores, chamados células. Dentro de cada célula uma estação transmissora/receptora de sinais de rádio é encarregada de manter comunicação com os usuários ali presentes. Esta estação é denominada Base Transceiver Station - BTS, ou, no jargão nacional, Estação de Rádio-Base - ERB.

A área de cobertura de cada célula depende de vários fatores, tais como a potência de transmissão, a topografia e o tipo de cobertura do terreno (água, vegetação rasteira, vegetação densa, edificações, etc.). Quando é feito o projeto de cobertura de uma determinada área usam-se programas de computador especializados para calcular o alcance previsto para os sinais de rádio em função dos dados conhecidos sobre o terreno e os parâmetros de frequência e potência de transmissão. Entretanto, como se costuma dizer neste ramo da engenharia, transmissão de rádio é ciência, mas recepção é bruxaria. Por isso é indispensável verificar, após a instalação, as diferenças entre a distribuição geográfica prevista e real da intensidade do sinal de rádio das BTS, e fazer ajustes para compensar os erros. Este processo é conhecido como drive test. Como a configuração do terreno pode sofrer modificações (novos prédios, demolições, reflorestamentos, deflorestamentos, aterros, terraplenagens, etc.), existe a necessidade de efetuar verificações periódicas (e ajustes) do desempenho de recepção de rádio via drive test.

O projeto de cobertura também procura manter uma certa superposição (overlapping) entre as áreas de cobertura das BTSs adjacentes, para que um usuário em movimento não encontre uma zona de "sombra" do sinal de rádio, o que provocaria a interrupção do serviço. O padrão real da cobertura é complexo, mas pode ser exemplificado de forma simplificada pela figura abaixo.


Para efeito de projeto (e para nosso consumo aqui), costuma-se usar uma representação mais simples ainda, considerando a área de cobertura das células como hexágonos regulares iguais, sem superposição, e sem espaços (gaps) entre eles, conforme o exemplo abaixo.


A qualquer momento o sinal do handset do usuário pode (e, normalmente, vai) ser recebido em mais de uma BTS. Cabe ao plano de controle da rede de acesso (vamos conversar sobre isso em outra parte deste artigo) decidir qual BTS será efetivamente utilizada pelo usuário (normalmente será aquela onde ocorre a maior potência de recepção do sinal do usuário). Quando o usuário se movimenta a potência do seu sinal recebida pelas BTSs também varia. Em algum momento o plano de controle da rede de acesso tem que decidir pela mudança da BTS onde o usuário está conectado. Este evento é chamado handoff ou handover. E pode ocorrer, basicamente, de duas formas: soft handover, quando o novo canal de comunicação é estabelecido antes do rompimento do canal antigo (make before break), ou hard handover, quando o novo canal de comunicação é estabelecido após o rompimento do canal antigo (break before make). Ambas as formas são utilizadas na prática. A possível desvantagem do soft handover é o fato de utilizar mais recursos de rádio, e o hard handover tem como desvantagem a possível percepção do momento da troca de canais pelo usuário.

Cada operadora do serviço celular utiliza (conforme as regras de acesso ao espectro de rádio em cada país) uma faixa de frequências (banda) para a transmissão do usuário para a BTS (uplink) e outra banda para a transmissão da BTS para o usuário (downlink). O conjunto destas duas bandas constitui uma portadora (carrier) para o serviço celular. Para efeito de alocação de espectro para o provimento do serviço cada país define faixas de frequência (ou bandas) para operação, normalmente identificadas por  letras. Cada banda de operação pode acomodar, normalmente, mais de uma portadora. A figura abaixo ilustra sumariamente a alocação das bandas de operação (uplink e downlink) para cada uma das bandas de serviço celular no Brasil.


O que resta explicar é como ocorre o compartilhamento do acesso às bandas de uplink e downlink pelos usuários dentro da mesma célula. Historicamente a tecnologia usada para este compartilhamento separa as diversas gerações da telefonia celular. A primeira geração (1G) surgiu no início da década de 80 do século XX, e já se encontra descontinuada. Caracterizava-se pelo uso de transmissão analógica, e houveram dois padrões principais: AMPS (Advanced Mobile Phone System) e TACS (Total Access Communications System). O AMPS foi originado nos Estados Unidos, enquanto o TACS foi desenvolvido na Europa. No Japão a NTT usou um sistema semelhante ao TACS, denominado JTACS (Japan TACS).

Todos os sistemas 1G usavam multiplexação em frequência para permitir o compartilhamento de acesso no downlink e no uplink.  Esta forma de acesso é conhecida como FDMA (Frequency Division Multiple Access). Embora a modulação utilizada seja FM (Frequency Modulation) e não AM (Amplitude modulation), os mesmos princípios básicos do deslocamento em frequência na multiplexação FDM que apresentei neste artigo anterior ainda são válidos.

A idéia geral do FDMA é dividir, tanto o downlink quanto o uplink, em subfaixas. Um par de subfaixas do uplink e do downlink formam um canal (channel) de acesso. O que diferencia cada um dos padrões 1G é a quantidade e largura de banda dos canais de acesso Na figura abaixo está representado o esquema geral de funcionamento do FDMA, e, logo a seguir uma tabela mostra as características principais dos padrões 1G mais utilizados.






Em uma rede de acesso FDMA, não é possível utilizar todos os canais simultaneamente em todas as células, porque existe a possibilidade de interferência entre usuários da mesma célula que estejam usando canais adjacentes em frequência, e entre usuários em células adjacentes no espaço que estejam utilizando utilizando o mesmo canal. Para resolver isso adota-se o planejamento de reutilização de frequências (frequncy reuse plan). A forma mais comum de execução deste tipo de planejamento é a divisão dos canais de comunicação em sete grupos distintos, e alocá-los a grupos de sete células adjacentes de tal forma que nunca duas células que usam o mesmo grupo de frequências são adjacentes no espaço. No exemplo abaixo cada grupo de frequências é identificado pelas letras de A a F.

Grupo básico de sete células
Cobertura geográfica com grupos adjacentes de sete células
Na próxima parte deste artigo vamos prosseguir com este assunto, chegando aos anos 90 do século XX, o processo de digitalização das redes de acesso da telefonia celular e os padrões da segunda geração (2G) da redes de acesso para telefonia celular.

Nenhum comentário:

Postar um comentário